Esses dias me deparei com uma garota tentando se justificar do porque não ler. Dizia ela, que os livros são caros e que demandam muito tempo, tornando assim inviáveis a medida que acordamos, trabalhamos, e quando chegamos em casa temos pouco tempo, e que no geral esse tempo já é muito bem ocupado com a janta e a televisão. Acho que o que mais me assustou foi sua firmeza ao afirmar esses conceitos de que o não se tem tempo para ler um livro. O conceito de livros caros foi combatido com o argumento que existem grandes livros em edições de bolso, citei a LP&M por exemplo, e ela disse que duvidava ter algum título realmente bom em edições tão baratas. Quanto ao conceito de tempo eu não entrei em mérito de questão pois a pobre infeliz de fato preza e muito sua novela de cada dia.
Dentro dessa discussão, ficou totalmente cabível, recomendar o livro Tristessa do Jack Kerouac, algo até poético, tendo em vista que certa vez me deparei com um exemplar desse pequeno romance sendo vendido em uma rodoviária a beira da estrada por míseros seis reais. Apesar que a aquisição dessa edição não se deu nesse dia lírico, um motivo nobre enalteceu da mesma forma, comprei o livro pra minha namorada que compartilha mesmo gosto pelas letras.
Aonde está a beleza de um subúrbio na cidade do méxico, e em uma personagem junkie decaída? Uma viciada em morfina que se arrasta pelas ruas mortas da Cidade do México? Nessa pequena história acompanhamos Jack em seu envolvimento poético com essa personagem tão rica como Tristessa pode ser (nome que define por si só o clima envolto). Amor e compaixão que se tropeçam e caem em câmera lenta diante uma sociedade de bandidos e tudo que há de sujo no submundo.
Admito que nas primeiras páginas, por mais que esteja acostumado com a escrita do beatnik, a estranheza e o desconforto imperaram. Ele narra tudo de forma pulsante, um fio de pensamento jogado e destrinchado em um apanhado de letras. Algo como as idéias em Estado Bruto, sem trabalho algum, o que muito bem poderia ser um rascunho, mas que com tamanha sutileza e sentimento transformasse no mais belo exemplo de arte.
Alguns trechos que me saltarão os olhos, me fizeram menininho de seis anos em noite de natal, frente ao embrulho carnavalesco:
"La vida es dolor" (a vida é dor), ela concorda, diz que a vida é amor.
...
... Ela sorriu e desceu com passinhos miúdos e a mão na saia, com aquela lentidão linda e majestosa de mulher, como uma ninféia chinesa.
"Não somos nada."
"Podemos morrer amanhã"
"Não somos nada."
"Você e eu."
Eu acompanho-a educadamente com a lanterna até a rua, onde chamo um táxi branco para levá-la para casa.
Desde tempos imemoriais e adentrando o futuro sem fim, os homens amaram mulheres sem dizer a elas, e o senhor os amou sem dizer, e o vazio não é o vazio porque não há nada para ser esvaziado.
Estás aí, Senhor estrela? - Suave é o chuviscar que perturbou minha calma."
...
Tristessa está me segurando e aos poucos aproxima seu lindo rosto moreno do meu, com um sorriso precioso, e finjo quase deliberadamente ser o americano confuso - Olhe, eu ainda vou salvá-la -
...
E faz menos de um ano que ela estava em pé em meu quarto e disse "Um amigo é melhor do que pesos, um amigo que dá isso para você na cama" quando, de qualquer forma, ela ainda acreditava que conseguiríamos juntar nossos ventres torturados e nos livrar de um pouco de dor _ Agora tarde demais tarde demais.
sexta-feira, abril 25, 2008
Tristessa - Jack Kerouac
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literatura
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