sexta-feira, agosto 08, 2008

Acordei fedendo álcool, ainda deitado busquei o controle do rádio em meio as bitucas de cigarro no criado mudo. Play. Jeff Buckley. Esse cara é um filha da puta, ele sim sabia de tudo que eu estava sentido. O que me resta é esperar no fogo mesmo. Ver se me queimo, ver se voltando as cinzas organizo alguma coisa na minha vida. Ela é minha mulher. Eu não quero dar um último adeus e partir pra outra. Minha vida não é um produto descartável. Uma vez rompido o lacre, deve-se utilizar até o fim, aproveitar o máximo, uma vez jogado no lixo não vão lhe dar um novinho em folha. Meu coração não é fast-food. Porra, beije-me. É pedir muito?

O vizinho tá movendo a mobília da casa. Essa cidade é sufocante. Eu achei que isso não poderia acontecer comigo. Estou largado aqui. Acendi outro cigarro e me sentei na cama. O sol batia forte na janela do quarto, aquilo era um forno e o vizinho fazia uma barulheira infernal. A minha cabeça ia explodir a qualquer momento. E as memórias de nós dois, memórias de algo que nunca aconteceu... você me deu algo, me deu algo que nunca soube estar dando, e agora arrancou a mordidas. Queria poder superar esse muro. Talvez não seja possível uma vez que você, de fato, não me conhece bem. Por favor, me beija, com desejo, com ardência, nada de pena.

Meu pai grita lá debaixo, quer ajuda na oficina. O velho manja das coisas, achou a mulher da vida dele, é apaixonado, faz o que ama também, um espanhol foda. Queria que esse mesmo sangue que corre em nossas veias me trouxesse a mesma sorte que ele teve. Pego o telefone e disco para ela. Caixa postal. Me levanto, o homem tá uma fera, passou do meio dia e temos um carro pra entregar logo mais. Me jogo no chuveiro pra curar a ressaca. Eu daria todo meu sangue por uma palavra de carinho sincera saída da boca dela.

A água gelada enxurra minha nuca e olhando pela janelinha vejo a chuva caindo lá fora. É mesmo um lamento pelos jovens que deixam o amor escorrer pelos dedos. Mas acontece que hoje você está tatuada na minha alma, eu não tenho outra opção se não enfrentar meu destino. Sim, sou muito jovem pra suportar uma situação dessas, mas também velho demais para deixa-la de amar. Será que tenho que esperar e descobrir que não fui feito pra ninguém? Besteira! Ela é minha, fui feito pra ela. Você devia vir em minha direção, não é tarde. Solitária é a minha cama desarrumada, eu sou sonhador é diferente.

Nunca acaba. Eu daria todo meu reino por um beijo no canto dos lábios dela. Não, realmente nunca acaba. Eu queria a doçura do sorriso dela. Olho pra baixo e vejo meu pau flácido pendendo sem desejo, nem ele tem vida sem essa maldita. Eu sou jovem demais pra isso. Mas vou atrás. A água escorre sem dó por todo meu corpo, da mesma maneira que o desejo e amor incondicional escorrem pela minha alma. O Jeff ainda canta lá no quarto. O velho grita da oficina e o vizinho redecora a casa. Eu sinto estrelas na minha barriga.

Jogo uma roupa no corpo e escoou escada abaixo. Jogando um cigarro na boca, sem nem me preocupar de acender, passo pela oficina, ele pode esperar. Até minha bike pode esperar, saio caminhando mesmo. Irei até o serviço dela, no horário do almoço e confrontarei meu amor. Todas essas lágrimas que eu chorei vão secar, será um novo começo. Ela vai ver a verdade no meus olhos, me desejar e eu serei dela, e ela minha. É cedo e tenho todo o tempo do mundo, vou caminhar até o outro lado desse rio morto. Acendo o cigarro, passo no boteco da esquina e vejo uma japonesa, por um segundo minha mente prega uma peça. Essa é mais alta, não tão bela, não é nada que minha amada é. Não vou deixar minha alma se enganar por outra. Meu coração não é de ferro, mas darei um jeito.

Meu amor é uma rosa morrendo, perdendo as pétalas e murchando sem água. Pouco importa, basta um sorriso dela. E minha rosa floresce mais bonita do que antes. Sento num muro na frente do estacionamento e fumo o quinto cigarro da manhã. Minha vida tem se resumido a quantos cigarros fumo até ser homem e encara-la novamente. Em uns dez minutos ela deve estar saindo. Esqueci o Jeff tocando no quarto, até que é uma boa, um pouco de alma naquela cama solitária. Eu vou precisar dela para sempre. Eu sei disso. Cinco minutos. Ele deve estar cantando tudo que sinto agora, ele sempre está cantando tudo que eu sinto, agora mais do que nunca. Próximo do portão vejo um rapaz de costas, a camiseta do Sonic Youth, a fúria toma meu corpo, quando resolvo reagir, vejo que não é um rapaz. Todo mundo veste o Sonic Youth, todos aqui amam ela, e ela ama a todos. Eu sou a variável fora da equação.

Mordo o lábio com força até sentir o sangue preencher minha boca. Essa vida eterna de um estrupo atrás do outro. Sim, ela estupra a porra da minha alma todos os dias. Chuto uma lixeira e cuspo um beijo no ar em direção ao prédio daquela vaca. Você pode até ser meu amor, mas não disputarei atenção com todos esses rostos sem face. Uma multidão de engravatados começa a preencher toda a rua, me perco naquela mar de gente. Infiéis. Morte, esse inferno é demais pra um jovem como eu. Aonde está meu amor? Aonde está minha felicidade? Meu lábio sangra, eu cambaleio no fluxo do mar de gente e deságuo num boteco sujo. Peço pinga e bebo muito mais do que uma vida eterna pode agüentar.

“Luidou?”

Aquela maldita estava na minha frente. Queria quebrar o copo de pinga na cara dela, e fatiar aquele lindo rosto. Não controlo meus sentimentos, choro compulsivamente antes de conseguir falar qualquer coisa. Ela parece nitidamente atordoada, mas deve ser meu coração bêbado imaginando coisas. Ao me levantar vou direto ao chão e logo trato de me escorar no balcão e forçar uma risível tentativa de que nada aconteceu. Ela ri. Eu choro.

“Você me ama?”

Choro e desabo novamente, desta vez sobre o balcão. Turbilhão, a mão dela na minha nuca. Na minha mente seus lábios nos meus. Meu sexo pulsa por desejo de sua carne. Eu não tenho controle do meu corpo. Choro, soluço, sangro, apago minha alma, apago minha consciência. Eu sei que acabou, mas eu continuarei escalando essa cama imensa e vazia. Eu queria saber porque estou sozinho hoje. Se eu sou boa pinta como ela diz, se eu sou encantador e cheio de qualidades porque vou pra cama sozinho? Eu sei porque. Porque hoje é igual a qualquer outra noite. Desmaio ali mesmo, indo de cara no chão. O amor era pra ser natural e real, mas pra ela não. Nem hoje, nem para alguém como você e eu. E a guilhotina cai.

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