segunda-feira, setembro 01, 2008

Estou na Rua Augusta. Escuto uma música dos anos 60, meu estômago se contorce. O balcão do botequim é de um granito impessoal, frio como a alma dessas putas que tomam o último trago da noite. Nesse boulevard, a decadência é alimento pro meu ego. Ao fundo tem uma mesa de bilhar, um casal de veados faz um jogo lento e cheio de enrabadas descabidas de pudor. Lá fora a chuva rala insiste em criar essa atmosfera congelada. Olho e não sei se já passou muito ou pouco da meia noite, nada mudou. A vida de todos que estão por aqui não vale uma garrafa de uísque bom. Me contento com um velho oito e encaro o reflexo de um morto no balcão reluzente.

Ainda estou meio anestesiado e não lembro de muita coisa. Não lembro do último porre, nem lembro como vim parar no centro. Foi dado um delete em algumas memórias, agora estou razoavelmente lúcido e sei que devia estar em casa. Olho pra tevê velha e mal sintonizada e alguma produção B passa no corujão. A porta de ferro do bar já está semi fechada e pago a conta. Não sei com qual dinheiro, respiro, olho para a rua e vejo o sol se levantar ainda que tímido. Sinto a vida começar a brotar na cidade.

Caminho rumo a Paulista e meu estômago me lembra que provavelmente a última coisa que ingeri foi no café da manhã passado, ou pior, antes disso. Aos poucos as ruas vão se enchendo de escravos. Inspiro e expiro, sinto a realidade voltando a tomar conta do mundo. Bêbado e desesperançado não tem espaço no nosso pequeno mundo. É, o mundo é uma pequena gaiola.

Sinto apenas meu corpo, tenho esperança de não ser apenas um zumbi. A barriga doí e me lembra que sou humano. Apesar de não ter decência alguma, eu estou compondo deliberadamente minha própria história. Passo a mão no bolso e vejo mais algumas notas amassadas e resolvo tomar um ônibus pra casa. Enquanto todos estão vindo eu estou voltando. Minha cara crivada de tristeza deve provocar compaixão, duas pessoas me perguntam se estou bem.

Silêncio no caminho. Escuto o motor, escuto o trânsito porém nada é sútil o suficiente para me fazer fugir do silêncio. Sonho um déja vu. Sou um perverso urbano, masoquista e sem escrúpulos. Chegarei em casa fedendo álcool e provavelmente levarei uma sova do velho. Deixei ele na mão, as motos devem estar acumuladas e a culpa é minha. Só me resta o vazio que é trabalhar sem objetivo, trabalhar sem sonhar, viver sem ela.

4 comentários:

Anônimo disse...

É verídico ?

" ... Essa ferida, meu bem
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã."

John disse...

Posso dizer que sim. Ficção baseada em realidade. Tentei lhe agradecer o comentário por email, e só hoje vi que voltou. Gostei do seu blog. Obrigado.

Beijos.

Ana Carolina disse...

infelizmente é ficção baseada na realidade.

mas pelo menos te serve de material e eu gosto disso.

beijos.

Uidol Macaya disse...

E que se foda o Luido