Eu amava ficar olhando o céu pela janela quando tinha meus dez anos de idade. Ficava parado uma porção de tempo, criando meus reinos mágicos e os terríveis dragões a serem derrotados. Eu era sonhador, era sonho e era real. O Nirvana já virava história, não que isso fizesse muita diferença a minha pacata existência, viria a fazer tempos depois, porém todo um mundo se desdobrava em acontecer o presente como tempestade, e eu lá, feito rocha. Meu mundo era as peladas no prédio, as brincadeiras como Polícia e Ladrão, Barra Manteiga, Queimada e tantas outras. Tudo isso e ainda não existia a princesa a ser resgatada do maléfico dragão. Moleca de si, loirinha, parecia saída de algum filme. Raramente se jogava no tanque de areia conosco. Na verdade, consigo contar nos dedos as vezes que ela apareceu. Ela nem tinha idéia de quem eu fosse. Um ano mais nova, morava na cobertura e aparentemente tinha uma vida muito bem resolvida fora daquele prédio que guardava tantas histórias. Mas pra mim, ela é que era a princesa a ser resgatada. Ela me apresentou a palavra solidão, o fato único que era se sentir só, trancado no quarto ouvindo Pearl Jam ou Soundgarden. Imaginação a mil correndo sobre vales e enfrentando hordas de batalhões para conquistar o coração dela. Sem contar as aventuras de espionagem, inspiradas pelo 007, em que furtivamente invadia o telhado do prédio e passo a passo me colocava a espia-la em sua piscina. Será que é marca da doce visão inocente da criança: a mágica em torno de alguém que nem se conhece? Quantas e quantas vezes me deitei e coloquei-me a forçar um sonho perdido sobre minha musa? Borges dizia, perca a capacidade de sonhar, então perderá a esperança e estará a um passo da cova. Sinto-me quase agredido por ser assim, palhaço de circo, pronto pra levar tortadas e servir de riso para a massa. Só porque busco acreditar que a magia está no olhar, e que busco dia após dia, aquele olhar de criança, aquele primeiro e furtivo olhar que merecidamente me colocou em doces devaneios. Aquele pequeno momento em que ela nem sabia quem eu era. Mal podia imaginar toda a história que ainda viveria com aquela garota da cobertura. Agora acho que sou responsável demais para frustar qualquer espectativa, ou pior, libertino em demasia, pronto a uma entrega assustadoramente completa para pessoas normais. Projeto vida, rumo a mais um ano.
quarta-feira, dezembro 26, 2007
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