sábado, outubro 25, 2008

Luidou no fim.

hoje eu trabalhei bastante na oficina. meu pai foi atencioso, percebeu que algo ia errado, quis saber quem era a garota. o velho é foda, matou todo o mistério em menos de meio expediente. minha resposta foi dada com um silêncio e uma maior concentração no trabalho. sentei pra almoçar banhado de suor, fazia um calor infernal e aquela garagem era um verdadeiro forno. comi muito depressa e tomei um café. voltei pro trabalho. era só me manter ocupado. o céu tava num tom violeta bizarro, e eu nem vi o tempo passar. quando me dei por conta, não tinha mais o que fazer, havia desmontado e recolado as peças da moto centenas de vezes. eu estava vazio, tinha escorrido junto com todo óleo que tiramos da moto. sentei com as mãos sujas de graxa no velho vaso de minha mãe, que outrora sustentava uma bela palmeira em miniatuara, agora não tinha nada, terra batida e bitucas de cigarro, e o tempo que não volta pra essa planta. meu velho tinha saído pra fazer uma entrega, sentei ali no escuro e chorei. lembrei de nosso beijo projetado. nunca chegou a ser como eu sonhei. estávamos na praia, nadávamos e beijávamos como velhos amantes. Depois ela se vestiria e com seus olhos brilhantes me diria que me ama. eu quase sentia a noite de verão escorrer por meu corpo sujo. se não fosse o gotejar chato da torneira do outro lado da oficina. refleti por uma fração de minuto, não sei porque, alguma coisa se rompeu dentro de mim. parei de chorar, as lágrimas secaram. meu coração despejou todo o âmago de cólera e tristeza num choro sem lágrimas, sem barulho, um pranto silencioso e fatal. nem certeza de estar vivo eu tinha. afinal vivia como um morto. ela, Ana, ela me matou. me olhei no espelho da moto, tinha os olhos vermelhos, cheios de um profundo vazio. reencontrei a cama, fui direto pro meu quarto. estava esgotado. acho que dormi, ou não, me dei por conta de algumas estrelas, tão raras no céu dessa cidade. a paz da noite acalmava minha alma. a noite, nada mais era do que uma trégua entre dois dias torturantes. não me sinto pronto a reviver tudo. essa grande cólera, esse grande vazio deixado por ela, ainda não purificou esse bastardo. eu, estou indiferente a mim mesmo. desprendi-me desses valores fúteis, desprendi-me de mim mesmo. Ana não vai voltar a figurar aqui, nem mesmo eu vou voltar a figurar aqui. Com o que resta de coração, desejo que me apedrejem com ódio do covarde que me transformei.

Um comentário:

Uidol Macaya disse...

È. O ceu continua violeta bizarro