Acabou com um enorme vazio.
Era começo de ano e eu ouvi daquele velho japonês que estava despedido, que eles estavam precisando repensar o departamento, que infelizmente não tinha como me colocar no novo quadro, então eu fui, e a próxima coisa que me aconteceu foi uma viagem pela América do sul. Vagando por aí à toa ao lado da mulher que amo.
Não sei se venho aqui contar uma história de um fracasso, de uma busca ou simplesmente um conto de amor. O que quero dizer com essa pequena estória é que existe uma inquietude em todos nós, e ela não pode ser ignorada de forma alguma.
Começar pelo fim pode ser clichê, mas sinto uma enorme necessidade de desabafar o vazio agudo que me incomoda desde que despertamos desse sonho. Esse silêncio do quarto grita o tempo todo. Agora ela está de volta ao trabalho e eu vou passar a maior parte do tempo só. No começo é fácil, arrumamos o que fazer, botamos em ordem pendências, mais depois começa a ficar difícil. E esses poucos dias de viagem fazem uma falta danada.
Mas vamos ao fracasso, ou não. Foi tudo planeja meticulosamente, com mochila nas costas o destino era Ushuaia, a cidade mais ao sul do mundo. A passagem até Buenos Aires estava comprada a alguns meses e o resto seria feito na base do improviso. Mas nem tudo saiu como pretendíamos, principalmente quando algumas previsões falharam e o que seria uma viagem mítica ao sul tornou-se uma quase impossível jornada para dois jovens.
Eu sei que faltou um pouco de culhão para mandar muita coisa a merda e ir de carona, sem ter lugar para ficar ou mesmo arriscar de dormir no relento. Mas quando do lado caminha a sua amada, pesa. Pesa muito uma decisão dessas. Um sentimento de guarda baixa e buscamos de certa forma um conforto minimo, uma segurança mínima. Isso não tira o mérito de uma viagem maravilhosa. Cheia de encanto e que realizou o impossível. Uniu mais ainda dois jovens.
Saindo do vazio desse quarto velho, aonde tantas recordações de infância repousam, vamos direto para a década de 50. Uma avenida de ouro. Uma pequena Europa encravada no mundo novo. Buenos Aires carregava toda a áurea dourada do velho continente. Nosso hotel tinha uma entrada majestosa com duas portas de quase três metros de altura. Adornos talhado a mão pelos melhores marceneiros. Escadaria de mármore branco e corrimões de ferro fundido, trabalhado e retorcido em perfeita harmônia. Hoje, não passa de um fantasma velho do passado. Como que coberto de pó e adormecido em uma época inexistente o hotel sobrevive em tempos da praticidade do plástico.
Foi ali, em um quarto velho, no final do corredor. Ali tivemos nossa primeira noite em solo portenho. Em meio ao glamour acinzentado e o fervor de nossa paixão fizemos amor ali. Era um gozo pela liberdade, pela nossa vida ainda não vivida e pela jornada que estava começando. A cama velha rangia, o pé direito alto deixava espaço de sobra para nossas ambições.
Buenos Aires se tornou pequena para nós. Passeamos por suas ruas, por sua grandiosa arquitetura, por seu porto, por sua periferia. Andamos apaixonados e nosso desejo estava ao sul. Era apenas o começo. O duro golpe veio logo ali. Veio logo ao pisar no ringue, beijamos a lona praticamente no segundo após ouvir o gongo anunciar a luta. É uma facada ver sua amada chorando desolada por um sonho ser rasgado em nossa frente sem que pudéssemos fazer nada.
Se foi a crise, se foi a situação econômica precária do terceiro mundo, se foi má fé portenha, se foi o diabo se divertindo a nossas custas nunca vamos saber, porém o que era um custo passou a ser duas vezes mais, logo no primeiro dia. Teríamos que buscar alguma alternativa. Faríamos o roteiro de trás pra frente. Quem sabe descer pelo interior seja mais barato, uma vez que em época de férias Buenos Aires inteira viaja, e obviamente as passagens ficam mais salgadas. E com a confiança abalada mas não destruída partimos para Córdoba, em busca do Chile, e futuramente do sul extremo.
sexta-feira, fevereiro 06, 2009
Sul - Parte 1
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